Onde está a matéria do cosmos? Astrônomos encontram matéria perdida no Universo

Parte da estimativa da matéria visível no Universo não era observada por astrônomos antes e foi encontrada agora.
No Universo há diferentes tipos de componentes sendo elas a matéria visível, a matéria escura e a energia escura. A matéria visível, também chamada de matéria bariônica, é a matéria que conhecemos e observamos. Apesar da maior parte da matéria ser a matéria escura, modelos cosmológicos preveem que o Universo deveria conter uma quantidade maior de matéria bariônica do que conseguimos observar diretamente.
A discrepância ficou conhecida como o "problema da matéria bariônica desaparecida". A hipótese é que a maior parte dessa matéria estaria distribuída em forma difusa entre galáxias. Outro problema relacionado é a ausência de pequenas galáxias em torno da Via Láctea. De acordo com simulações, nosso halo galáctico deveria abrigar centenas de galáxias menores, mas observamos apenas algumas dezenas. Esse "déficit de galáxias" é associado com parte da matéria que estaria desaparecida.
Recentemente, um estudo usando dados de telescópios de raios-X detectou parte dessa matéria considerada ausente em filamentos de gás que conectam aglomerados de galáxias. Esses filamentos, que estão a milhões de anos-luz de distância, chegam a milhões de graus. Com temperaturas altas, os átomos de hidrogênio e oxigênio estariam ionizados, confirmando que parte da matéria bariônica está realmente nesses espaços intergalácticos.
Matéria que está desaparecida
Quando consideramos a matéria bariônica, estamos falando da matéria que é composta por partículas como prótons e nêutrons, ou seja, toda a matéria que forma estrelas, planetas e até nós mesmos. No entanto, observações astronômicas indicam que conseguimos ver apenas cerca de metade da quantidade de matéria bariônica prevista. Os modelos são baseados nas observações da radiação cósmica e na aceleração de galáxias.
Uma hipótese para explicar essa diferença seria que a maior parte dessa matéria ausente não estaria concentrada em galáxias ou estrelas. A ideia é que ela estaria distribuída em estruturas finas e difusas entre galáxias, como filamentos de gás aquecido. Por estarem extremamente diluídos e ionizados, esses filamentos são difíceis de detectar diretamente no espectro do visível, sendo necessários instrumentos de raios-X.
Déficit de galáxias
Outro problema relacionado com a falta de matéria visível sendo observada é o déficit de galáxias satélites em torno da Via Láctea. Esse problema ficou conhecido como “problema das galáxias satélites ausentes”. De acordo com modelos cosmológico padrão, o halo da nossa galáxia deveria conter centenas de pequenas galáxias anãs orbitando ao seu redor. No entanto, encontramos até hoje apenas algumas dezenas, um número significativamente menor do que o previsto pelo modelo.
Uma explicação é que muitas dessas galáxias são extremamente pouco luminosas ou que o processo de formação estelar nelas tenha sido interrompido. Recentemente, alguns avanços na tecnologia dos telescópios encontraram algumas dessas galáxias perdidas, mas ainda faltam várias para chegar ao número esperado. Essas observações mostram que a ideia que essas galáxias sejam muito fracas para serem observadas esteja correta.
Encontrado a matéria
Em um artigo publicado recentemente, um grupo de astrônomos utilizaram dados de raios-x dos telescópios XMM-Newton e Suzaku junto com dados ópticos para estudar o superaglomerado de Shapley. Esse superaglomerado é uma das maiores estruturas conhecidas no Universo próximo com cerca de 8000 galáxias. Usando os dois telescópios para mapear regiões de emissão fraca, o estudo encontrou um filamento de gás conectando quatro aglomerados.
Esse filamento possui uma temperatura de cerca de 10 milhões de graus Celsius, indicando que hidrogênio está ionizado e é difícil de ser observado. Uma análise detalhada do filamento mostrou que ele contém uma massa equivalente a cerca de 10 vezes a da Via Láctea e se estende por 23 milhões de anos-luz. Isso é cerca de 230 vezes maior do que a Via Láctea. Boa parte dessa matéria seria essa matéria difusa esperada nos modelos teóricos que não haviam sido observada antes.
Rede cósmica do Universo
Além de encontrar uma possível solução para o problema da matéria desaparecida, as observações também ajudam a responder outra pergunta. A principal é que o filamento comprova a ideia que os aglomerados de galáxias estão conectados mesmo estando distantes. Isso ajuda a esclarecer a natureza da rede cósmica do Universo que é uma rede invisível de filamentos que estrutura o universo em larga escala.
Os resultados acabam reforçando o modelo cosmológico padrão e validam décadas de simulações cosmológicas feitas em computadores. Isso pode confirmar que a matéria desaparecida realmente pode estar escondida nesses filamentos que são difíceis de observar. Algumas missões, como a missão Euclid, está mapeando a estrutura e a evolução dessa rede cósmica que ajuda a investigar também a natureza da matéria escura.
Referência da notícia
Migkaset et al. 2025 Detection of pure WHIM emission from a 7.2 Mpc long filament in the Shapley supercluster using X-ray spectroscopy Astronomy and Astrophysics